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Mostrando postagens de agosto, 2010

Os Íssimos

Morro de saudades do tempo em que eu podia gritar para todo mundo ouvir. Hoje é só sufoco, um sussuro inaudível antes de dormir, um pensamento vago pelos cantos da memória.. procurando companhia. Essa anestesia me cansa, a apatia, a falta de vontade. Quero de novo os superlativos, os muito , demais e sempre , os íssimos tão raros por todo lado. Aquele desejo enorme de acordar no outro dia porque nada falta, ainda que não tenhamos tudo. A segurança de se sentir compreendida, de ter alguém para quem perguntar o que eu quiser. Porque não sei de nada. Mas quero tudo . Muito, demais, sempre.

Mais alto que a maior das árvores

O sol aquentava a terra das samambaias e as poucas gotas envergonhadas nas pétalas das azaléias no pórtico, enquanto acompanhava a melodia inebriante dos pés apressados dentro de casa, loucos por tirar o máximo de proveito daqueles minutos de vida perfeita que se esvaíam. Um café da tarde como tantos outros, cujos paladares entorpeciam os dissabores de ambos. Sinatra invadia a sala, os raios de luz iam ficando oblíquos. Um olhar puxava o outro, em movimentos singelos e compassados, inflamados pelo calor da inesquecível voz azul. Eram dois corpos que voavam com o momento. A cada rodopio, as articulações se fragilizavam, os dedos perdiam a força. Fios de cabelo se apegavam à madeira do assoalho enquanto a tez perdia o viço. Envelheciam como tudo mais. O tempo dava conta de apagar cada sinal de vida, deixando em troca sardas e manchas por toda a pele. Um inimigo sem piedade, incorruptível, insubornável. Mas estava tudo bem. Ali, o tempo era deles. Vigiava-os do canto, mas os deixava serem

A noite do meu dia

Houve uma época em que um "Bom dia" era o êxtase do meu dia. Ao receber esse cumprimento, não conseguia mais controlar minha boca, que se distendia num sorriso sem fim. O que se seguia ao "Bom dia" ficava na minha cabeça por dias e dias, virava nome de blog, senha de banco, data de dentista. Qualquer coisa de que precisasse me lembrar, era só usar o bendito "Bom dia" que dava certo. Ele, por si só, não se deixava esquecer. Ainda não deixa, embora tenha abrandado um pouco. Mas, hoje, tudo o que eu queria era um "Boa noite".

Fly me to the Moon

Tenho um vício. Que não tem nome. Tem timbre. Sou viciada na Voz - não em qualquer uma, veja bem. Cheguei ao ponto de carregar comigo, a todo tempo, minúsculas doses, escondidas da vista alheia em bolsos, sacolas, na bolsa... em momentos mais ousados, cerro-as na palma das mãos, como se ela pudesse absorvê-las e assim aliviar minha abstinência, sem necessariamente ceder. Escondo a Voz de todos, com medo da punição por meu crime. Mas ela não se esconde de mim. Ela me procura, incita, foge. Aparece por milésimos de segundos enquanto durmo, etérea, pacífica, entregando-se alva como a noite ao meu prazer. Sorri desajeitada e o impulso de agarrá-la e comê-la com todos os dentes me faz despertar. Penso nas doses, me regulo. Um café termina de me acordar, vou para o trabalho. No semáforo, tenho certeza de que a vi passando em outro carro, zombeteira por ter conseguido mais um. Mas, minha cara droga, eu não ligo se você quer se reproduzir loucamente por sorrisos fracos. Já te prendi para mim.