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Das poeiras que me cercam o sorriso

Não sei mais o que é adeus. Ou a Deus. Fui perdendo os dois aos poucos, mas posso me lembrar vividamente do dia em que descobri o que era ir embora. Fazia frio, e eu tinha acordado cedo para uma das obrigações infantis de uma família então católica. Escutava há duas horas cantorias e pais-nossos e fábulas sobre o joio, o trigo e os homens. Toda aquela atenção a histórias que perdiam a graça perto dos Lobatos e Shakespeares me entediava um pouco. Completava meu livro com palavras copiadas da página anterior, como dizia no enunciado, já certa de que havia algo de errado naquilo tudo. E pensava nos olhos dele. Naquela ternura azul brilhante que irradiava toda vez que sorria. O lugar onde me encontrava agora aumentava minhas preces, que não se pareciam em nada com o que me haviam ensinado. Tinha aprendido a conversar com Ele nas noites de lua clara em que os gritos e brigas reinavam na cozinha logo abaixo de meu quarto. Costumava fugir para o quarto de ninguém, abrir a enorme janela de v

No palco descampado

—Ainda escrevo pela necessidade de expulsar o que sobrou – disse ele, por linhas tortas que não eram para mim. Mas era como se tivessem saído de minha boca. Cada palavra gélida e triste, carregada da felicidade do amor que um dia foi, e que então resolveu ir de vez, e nunca mais voltou. Sinto cada pensamento dele correndo pelas sinapses, como se fossem apenas velhas memórias que eu estivesse relembrando. Sei que deve parecer um pouco psicótico. Mas foi isso o que pensei, como era possível que soubesse tudo a meu respeito? Ou que duas histórias se repetissem? Ou que cada vírgula e pausa combinassem perfeitamente comigo? Sei que nas montanhas as noites são parecidas. Na imensidão de terras e vales, o olhar é logo atraído pelo céu, fascinado por suas nuvens embaçadas e raios de luz atravessados. Não há mar que leve para longe as saudades de tantos dias. Não há Iemanjá que resolva nossos problemas. Cai tudo sobre nós, que recorremos ao campo para transformar cada semente de emoção na últi

Quanto do teu sal

A sétima palavra mais difícil de ser traduzida no mundo todo não é outra que não a nossa Saudade. Cunhada através dos tempos por meio do latim para Solidão, nossa Saudade criou raízes na época das grandes navegações, provavelmente para descrever o sentimento das mulheres deixadas para trás pelos marinheiros de outrora. Uma sensação de falta, um desejo de possuir o que já fora seu, a privação da companhia, a solidão, certa incompletude, melancolia e nostalgia. O sentimento da espera. Tudo junto. Saudade, em sua essência, transcrevia um sofrimento. A dor da perda, do tempo atuante, da distância. Algo que só acabava se o matassem. O que torna ainda mais curioso como, nos tempos modernos, criamos certa veneração pela Saudade. Conseguimos a proeza de transformá-la em um sentimento belo, bonito de ser sentido e vivido. Lembranças doloridas passaram a nos trazer um sorriso aos lábios junto às lágrimas quase secas. O mar salgado de Fernando Pessoa já estaria doce nos tempos de hoje. Aprendemo

Stiflesiac

Com você aprendi na marra a ser menos egoísta, a amar de longe o que jamais estaria perto, a ter carinho quando tudo o que eu sentia era ódio. A segurar nos olhos as gotas amargas ao ver um sorriso, a abafar o grito incapaz de julgar. Não fiz mais manha ao perder uma discussão, e descobri como abandonar silenciosamente qualquer navio que naufraga. Aprendi a ter insônia. Parei de procurar pelo elo perdido e me cansei do mundo explicado. Enfim, enchi as malas de dúvidas e percebi que podia, sim, ser divertido conhecer o futuro aos poucos, de partida em partida, de país em país. Ainda que seja pouco.

Um mergulho da alma

Depois de um maravilhoso dia de sono, desperto com a alegria renovada de quem cumpriu seu dever. Abro as janelas para respirar o ar fresco de um fim de tarde. O sol ainda brilha tênue no horizonte enquanto pego uma calcinha limpa e uma regata e atravesso o quarto até chegar no banheiro. Esqueço a porta aberta, mas não há ninguém em casa. Desço as calças do pijama, que deslizam pelas pernas como cetim e logo caem ao chão. A calcinha é a próxima, e tem o mesmo destino da blusa. Passo uma escova pelas mechas revoltosas do cabelo, tirando os nós do travesseiro agitado de sonhos. Vou até o boxe e me aventuro com a ponta do pé no mármore gelado. A temperatura sobe em calafrios pelos dedos, tornozelo e perna. Estico a mão e abro o chuveiro. Bem pouco, só um filetinho de água fervente. O choque térmico me preenche com uma sensação de prazer infantil. Sei que posso mais. Continuo a virar a válvula e a água cai num jorro pesado de gotas translúcidas. Passo o outro pé para dentro do boxe, e me a

Questão de Perspectiva

Cada hora que passa, é mais por que te esperar. Prometo não reclamar de dois dias perdidos, das noites despertas, das manhãs cansativas e recompensantes. Nada disso faz sentido quando lembro do teu hálito fresco junto ao meu, das bobagens que insistes em dizer e das guerras de cócegas que dominam o colchão. Não encontro sobriedade na íris de teus olhos, e nem a quero: ando tomada pelos desejos insanos que acometem os incautos de tempos em tempos. Quando levantas da cama procurando pela água que já traguei, morta de sede enquanto tu não vias, sei que vou me encontrar nos vincos de teu rosto a sorrir comigo. Teus pés vão me levar para a cozinha, na busca noturna por sustento, e a minha mão é que abrirá a geladeira para pegar a última mousse de chocolate. Ficarei a te observar, sereno, a esvaziar num átimo a taça de vidro, pedindo com as covinhas, tal criança mimada, por mais. O furinho no teu queixo assim franzido me traz lembranças dos beijos que ainda te devo. Da aposta que perdi no

Precoces

—A lua está linda hoje. Já viu? E lá foi ela, correndo com sua camisola curta, abrir a porta da varanda para espiar. Ficou com medo de molhar as pantufas, porque não lembrava se havia chovido. Mas era tarde, os pés se adiantaram e logo estava debruçada sobre o beiral, olhando para cada lado em busca do satélite dos namorados. Em vão. Estava escondido n'algum lugar inalcançável pela vista de seu prédio. Tola bobagem, sabia muito bem como ele podia ser bonito. Conhecia da beleza as mais variadas formas, cheiros e sabores. A lua era só mais uma, que lhe causava inveja nesse exato momento por poder estar em tantos lugares ao mesmo tempo. Voltou ao telefone e contou que sua bússola andava meio quebrada, pois não sabia por onde procurar a lua. A conversa virou rota de mapa, e logo se transportaram para os planos de viagens do fim do ano. Alugariam um chalezinho no meio do nada, recheado de lareiras e vinhos, ou se abrigariam das ondas em um apartamento só deles, perto do sol e da agit

A princípio

Os joelhos doem se corro muito; por isso, prefiro caminhar. Passo sobre passo, e aquele sorriso gigante a me observar. Somos dois em passos lentos, perdendo algumas calorias e aproveitando o instante. Tenho medo de tropeçar, cair, bater de frente ao chão de pedra; tu também. Não sei até onde teus tendões se esticam, mas os meus às vezes são bem curtos, e logo tenho de aquietar um pouco. Mas gosto mesmo é de correr. Se pudesse, corria agora mesmo pros teus braços machucados e cuidava deles com um pouco de água do mar, areia e suor estrelado. Já sei que te devo esses cuidados desde o dia em que te conheci. O problema é que álcool não combina muito com esportes, veja tantos atletas pegos em exames e o escambau. Se desse, saltava por sobre memórias e ficava só com os pensamentos mais aconchegantes. Com o pé firme no piso de tacos corridos, me pego querendo me inebriar só com teus olhares, sonhar com teu cheiro e me descobrir outra. Mas você ainda não sabe.

A vingança da porta

Era um hábito antigo que ele tinha: entrar dando com a porta nos batentes — "Que te fez esta porta?" a mulher vinha e interrogava... Ele, cerrando os dentes: — "Nada! Traze o jantar." — Mas à noitinha calmava-se; feliz, os inocentes olhos revê da filha e a cabecinha lhe afaga, a rir, com as rudes mãos trementes. Uma vez, ao tornar à casa, quando erguia a aldrava, o coração lhe fala — "Entra mais devagar..." Pára, hesitando... Nisso nos gonzos range a velha porta, ri-se, escancara-se. E ele vê na sala a mulher como doida e a filha morta. (Alberto de Oliveira, poeta, professor, farmacêutico, parnasiano e uma graça total)

Ainda mais vida!

Benjamin Franklin é dos meus. Tem o dia 17 mais marcado que tatuagem. E fez de tudo um pouco, de enxadrista a escritor, inventor, diplomata e filantropo. Mas, a meu ver, seu genial experimento com a pipa corre lado a lado com um ato brilhante. Franklin nos presenteou com o provérbio "Early to bed, and early to rise, makes a man healthy, wealthy and wise", e, logo em seguida, satirizou os parisienses, afirmando que economizariam muitas velas se acordassem mais cedo para aproveitar a luz do sol. Era o princípio do horário de verão que tomava forma. Mais tarde, o entomologista Hudson viria a formar o conceito, que nos trouxe a possibilidade de adiar uma hora de nossas vidas. Naqueles dias tediosos e parados, em que a criatividade passa longe e a inércia destrutiva toma conta, quem não gostaria de pegar umas horinhas desse dia e passar para outro? Assim, simples. Fazer um dia ruim menor, e passar das vinte e quatro horas aproveitando outro dia extraordinário. O horário de verã

Rise and shine

I won't pretend I know any English. I don't. Writers should only write in their mother tongues, otherwise their stories get lost. But what if you need to reach that special reader? Who will surely struggle to understand every word you say in other language, but won't exactly get how he spins your world and makes you start to wonder a lot of What Ifs? That's all that is to blame on him; not being able to fully understand me whenever I want. But who can, anyway? Don't we all get lost in words without even saying them out loud? So this is just a short piece, a reminder. So you know you're always in my thoughts when I'm writing. This is something to back you up whenever you feel like giving up. Whenever you get lost again in wondering what a wonderful world. I could never wish to find someone as alike me, specially as far away as you. Yet I did, and there you are. I hope you'll be there forever. It is a beautiful day.

Céu de Brigadeiro

As grades que se fechavam em minha liberdade já se afastaram, inibidas. Levaram consigo meu medo de que houvesse, numa das intempéries malucas da vida, afastado-me da única porta rumo ao paraíso. Já não acho que haja apenas uma entrada, mas também não tenho certeza de que quero entrar. Ou de que já não estou lá. Pois veja tamanha tranquilidade que se apodera de mim. Hoje, sem futuro e com um passado do qual me esqueço, não sou ninguém. E ser ninguém é supremo. É o outro extremo do verbo, a completa ausência instalada no dia-a-dia. Troquei minhas responsabilidades por pesos menores, deixei algumas preocupações para trás. Decidi-me pela indecisão, mãe de todas as encruzilhadas. Permito-me assim abranger tudo, deixando no horizonte o brilho do potencial. Não mais busco ser alguém, pois hoje não sou. E tudo o que sou me deixa em paz. Certa de ter cumprido o que me propus e honrado meus princípios, sei que posso me preparar para qualquer batalha vindoura, pois hoje o céu está limpo e a lua

Que serait?

Das bordas do Aconcágua, ele me disse oi. Contou suas histórias, me chamou de gracinha, mais uma vez, em francês. Não bastou muito para voltarem todas as lembranças do que parecera outra vida. Fiquei revendo uma por uma, saboreando cada instante com a preguiçosa delicadeza de quem passou o dia sonhando acordada. E bastou menos ainda para que percebesse, como o estalo de uma folha seca ao se impor contra a sola batida, o impacto que grandes encontros causam nas decisões da borboleta. Mais que teoria do caos, veio para ordenar minha vida. Fico agora pensando no que será de tudo no próximo encontro.

Dos títulos da guerra

A vida ultimamente tem sido um circo. Mas daqueles de batalha. Tento, em vão, carregar-me das melhores armas disponíveis, sabendo que não estarão ali quando eu delas precisar. Mas preparar-me faz bem, anima a disposição, regula o intestino. Sinto que serei útil em breve. Útil para mim mesma, é verdade. Mas são pouquíssimos os sortudos que conseguem isso. Meu mês voa. O tempo dança com saudades de mim. Só que estou ausente. Angariando fundos para o confronto. Pesquisando táticas, estratégias, alternativas e, como em toda guerra, rotas de fuga. Fugir não é apenas sair correndo para longe do inimigo. É ficar, face serena e olhos calmos, observando a vitória do outro. E aceitar a nomeação que se impuser.

Os Íssimos

Morro de saudades do tempo em que eu podia gritar para todo mundo ouvir. Hoje é só sufoco, um sussuro inaudível antes de dormir, um pensamento vago pelos cantos da memória.. procurando companhia. Essa anestesia me cansa, a apatia, a falta de vontade. Quero de novo os superlativos, os muito , demais e sempre , os íssimos tão raros por todo lado. Aquele desejo enorme de acordar no outro dia porque nada falta, ainda que não tenhamos tudo. A segurança de se sentir compreendida, de ter alguém para quem perguntar o que eu quiser. Porque não sei de nada. Mas quero tudo . Muito, demais, sempre.

Mais alto que a maior das árvores

O sol aquentava a terra das samambaias e as poucas gotas envergonhadas nas pétalas das azaléias no pórtico, enquanto acompanhava a melodia inebriante dos pés apressados dentro de casa, loucos por tirar o máximo de proveito daqueles minutos de vida perfeita que se esvaíam. Um café da tarde como tantos outros, cujos paladares entorpeciam os dissabores de ambos. Sinatra invadia a sala, os raios de luz iam ficando oblíquos. Um olhar puxava o outro, em movimentos singelos e compassados, inflamados pelo calor da inesquecível voz azul. Eram dois corpos que voavam com o momento. A cada rodopio, as articulações se fragilizavam, os dedos perdiam a força. Fios de cabelo se apegavam à madeira do assoalho enquanto a tez perdia o viço. Envelheciam como tudo mais. O tempo dava conta de apagar cada sinal de vida, deixando em troca sardas e manchas por toda a pele. Um inimigo sem piedade, incorruptível, insubornável. Mas estava tudo bem. Ali, o tempo era deles. Vigiava-os do canto, mas os deixava serem

A noite do meu dia

Houve uma época em que um "Bom dia" era o êxtase do meu dia. Ao receber esse cumprimento, não conseguia mais controlar minha boca, que se distendia num sorriso sem fim. O que se seguia ao "Bom dia" ficava na minha cabeça por dias e dias, virava nome de blog, senha de banco, data de dentista. Qualquer coisa de que precisasse me lembrar, era só usar o bendito "Bom dia" que dava certo. Ele, por si só, não se deixava esquecer. Ainda não deixa, embora tenha abrandado um pouco. Mas, hoje, tudo o que eu queria era um "Boa noite".

Fly me to the Moon

Tenho um vício. Que não tem nome. Tem timbre. Sou viciada na Voz - não em qualquer uma, veja bem. Cheguei ao ponto de carregar comigo, a todo tempo, minúsculas doses, escondidas da vista alheia em bolsos, sacolas, na bolsa... em momentos mais ousados, cerro-as na palma das mãos, como se ela pudesse absorvê-las e assim aliviar minha abstinência, sem necessariamente ceder. Escondo a Voz de todos, com medo da punição por meu crime. Mas ela não se esconde de mim. Ela me procura, incita, foge. Aparece por milésimos de segundos enquanto durmo, etérea, pacífica, entregando-se alva como a noite ao meu prazer. Sorri desajeitada e o impulso de agarrá-la e comê-la com todos os dentes me faz despertar. Penso nas doses, me regulo. Um café termina de me acordar, vou para o trabalho. No semáforo, tenho certeza de que a vi passando em outro carro, zombeteira por ter conseguido mais um. Mas, minha cara droga, eu não ligo se você quer se reproduzir loucamente por sorrisos fracos. Já te prendi para mim.

Desde Lá

Fico imaginando, por vezes, o texto de quem primeiro escreveu; aquelas poucas e parcas palavras espaçadas miudamente entre as intenções, desejosas de expressar algo que ainda não fora inventado. Pois tudo que escrevo tem aquele sumo antigo, que sai de outras palavras, de composições alheias.. aquele leve toque de baunilha floral, que só podia vir mesmo do campo. Não sei escrever sozinha. Os dias que passam em branco são uma perdição. Vou perdendo a fala, a maciez, a sutileza. Aquele texto rudimentar provavelmente não saiu de duas palavras. E o seguinte se inspirou nele, e a coisa foi crescendo, até a avalanche dos Márquez, Andrades, Alighieris e Cortázares. Uma enxurrada de tudo que é vida dentro das letras. E eu, muito mais do que eles, preciso dos livros para ganhar energia, tirar a ferrugem das vírgulas, respirar uma nova ideia.

Diário de Bordo

Viajar é maravilhoso, mesmo quando muita coisa não dá totalmente certo. Percebi isso ontem, ao receber a seguinte mensagem de minha amiga: Meninas! Hoje tava no meu espanhol e a profe perguntou se alguém já tinha tido algum problema durante uma viagem.... Coitada, não deveria ter feito essa pergunta... passei o resto da aula contando nossa incrível aventura por Madrid!! 1- Ao chegarmos na cidade, descobrimos que nosso bairro era um bairro gay, com direito a várias saunas! 2- Com uma temperatura agradável lá fora de 3 graus, a água quente acaba. 3- Um casal acaba deixando essa água fria ligada e simplesmente alaga todo o corredor e o nosso quarto. 4- Não sabíamos o que fazer na cidade, entao resolvemos dormir e assistir aos otimos canais de tv aberta que só passavam filme pornô. 5- Ver a gordinha jogando comida no homem. 6- Pegamos um metrô lotado em que todos ficavam empurrando a gente. 7- Descobrimos que, nesse empurra empurra, assaltaram a Yasmin. 8- Fomos pro n

Soneto Só

Essa boca que não mais te beija ignora tudo que percorri Ainda tem os mesmos instintos, ainda te deseja, ainda te sorri. Contradiz tudo que quero, perto dos outros me trapaceia Exibe, tal qual voraz sereia, a mesma voz de manso melro. De face em face, perco a tua, em todo canto vejo a saída. Mas a brisa pelas brânquias se insinua Corta ríspida a mente, que, ao fim anuída, As lágrimas por vezes extenua; Procura, ainda que dela fuja, a recaída. Quero uma lei que proíba meu sorriso de te encontrar.

Vanity Card #269

"Sempre acreditei que parte de nosso problema em resolver as questões raciais na América vem de nossa inabilidade em nomear apropriadamente o que somos. Tirando os ocasionais Johnny e Edgar Winter, não existem pessoas brancas. Qualquer criança com uma caixa de lápis de cor pode lhe dizer que as pessoas brancas são, na verdade, bege. As mais doentes são acinzentadas. Seguindo essa lógica dos lápis de cor, pode-se facilmente perceber que não existem pessoas pretas. Elas são marrons. Ou talvez ocre cru. Ou ainda cor de terra queimada. Francamente, toda vez que escuto alguém comentar sobre o primeiro presidente negro da América, sempre penso, "Não, ele não é negro. Está mais para caramelo." E é por isso que acho que deveríamos nos acostumar a chamar-nos pelo que realmente somos. Como alguém pode discriminar uma pessoa racialmente chamando-a de "begezona" ou "ocre"? Não pode. Porque é exatamente o que a pessoa é. A melanina não mente. Compre uma caixa de

Tempestade Interior

E para quem achava que seria fácil, não, não é, ninguém realmente prometeu que o seria. Mas as linhas puxam para outro lado, a mínima espessura deixando suas marcas na pele. E ceder ao impulso natural, à tendência que surge de dentro, é uma missão tão difícil quanto não abrir mão de nada. Por mais que tudo possa ir a todos os lugares dentro de algumas condições, é fato cristalino que não se pode seguir todos os caminhos ao mesmo tempo. E então chega o desejo de mudança, de tudo novo. Parece que todo o corpo começa a entrar em ebulição, a arder, a coçar, a inquietar-se. E essa tempestade vulcânica só acaba quando o temporal passa, a seu tempo, a sua hora e lugar.

Meus Bem-Quereres

O período de férias tem um fator de utilidade essencial, pois é quando você consegue se desligar do mundo por inteiro para conseguir repensá-lo com cuidado. E, ao ficar sozinha por muito tempo em terras estranhas, não há como evitar o sentimento de solidão e estranheza. Por isso, pode-se imaginar qual foi meu contentamento ao receber a seguinte mensagem, de um estimado amigo: "(...) ultimamente eu tenho convivido com as pessoas e tudo bem, mas quase todos os dias se eu estou sozinho e não quero estar eu fico me perguntando qual companhia seria do meu agrado, e por diversos motivos eu praticamente nunca tenho uma resposta. toda essa introdução foi só para dar um fundo para eu dizer que gostaria da sua companhia hoje, sei lá, num café. no lugar, cafeteria, eu não bebo café, eu tomaria um suco." Além de reforçar a sensação que me aparece nas férias, esse recado me fez ver como certas pessoas e conversas fazem falta em nossa vida, e nós acabamos por deixar do jeito que esti