Fábula transviada
Quantas convicções perto de anos tão baratos! Seus últimos foram, realmente, fáceis. Nada de trabalho duro, de guerras nucleares no quintal de casa, de desnutrição. Beleza? Era com ela. A sedução era seu ataque mais eficaz: arrebatava dos homens nas rodovias, engravatados e alienados, às pedras enfeitadas por passarinhos descuidados. Conquistava a última batata-frita, encantava o namorado da amiga, enfeitiçava os primos. Tudo na base do lúdico jogo de Eros.
Mas liberdades assim trazem a opressão, e a menina tinha, ainda por cima, de conquistar suas oponentes. Os peões cor-de-rosa a invejavam, e não era para menos. Ela até entendia. O mosquitinho desse pecado capital sempre foi endêmico, e o serviço de saúde no país era tão anódino quanto a vontade divina de mover montanhas.
Como Deus não age, dinamites e tratores fazem a Sua parte. Em nosso caso, restou a tarefa ao policial do quarteirão de cima. Embora seu principal artifício fosse a violência, não hesitou ao ver nossa ninfeta passar. Seus olhos dilatados a acompanharam, sugando ardorosamente cada movimento de seu quadril. Ela, boba nem nada, conduziu os pés até que as palavras lhe saíssem. Uma autoridade? Iria dar mais charme à lista! E quem sabe esse não lhe levasse pra capital, cidade de muita variedade no cardápio? Claro, iria tentar, uma chance dessas! Ele, perdido em sua saliva. Ela, anestesiada por seus interesses. Tal camote prometia.
Entre tardes cinzentas e barulhos da rua, os dois se conheciam. Ajudados pela imaginação, conseguiam álibis perfeitos para o delito. Sim, álibis, mas álibis para si mesmos, pois era difícil aceitar o que a pele lhes gritava a todo momento. E delito pois, afinal, ela tinha dezoito incompletos, e ele, como chefe da segurança pública, deveria zelar com a vida pelo cumprimento das normas constitucionais, como sempre fizera.
Inexplicavelmente, a mistura do vinho ao azul anil deu um tom de roxo magnífico, arrasador, indissolúvel. Não vê-lo era impossível. Não beijá-la era improvável. O que antes era efêmero se consumiu em um tálamo apropriado, de pouco mais que dois metros. A menina, nunca mais menina, foi perdendo a malícia e os brincos. Vendeu as saias com os brios e se mudou (ao menos isso!) para a capital, com a promoção e o carro novos do Sargento. Assim, sem que se desse conta, o mundo perdeu uma de suas mais interessantes criações para um simples homem fardado.
Mas liberdades assim trazem a opressão, e a menina tinha, ainda por cima, de conquistar suas oponentes. Os peões cor-de-rosa a invejavam, e não era para menos. Ela até entendia. O mosquitinho desse pecado capital sempre foi endêmico, e o serviço de saúde no país era tão anódino quanto a vontade divina de mover montanhas.
Como Deus não age, dinamites e tratores fazem a Sua parte. Em nosso caso, restou a tarefa ao policial do quarteirão de cima. Embora seu principal artifício fosse a violência, não hesitou ao ver nossa ninfeta passar. Seus olhos dilatados a acompanharam, sugando ardorosamente cada movimento de seu quadril. Ela, boba nem nada, conduziu os pés até que as palavras lhe saíssem. Uma autoridade? Iria dar mais charme à lista! E quem sabe esse não lhe levasse pra capital, cidade de muita variedade no cardápio? Claro, iria tentar, uma chance dessas! Ele, perdido em sua saliva. Ela, anestesiada por seus interesses. Tal camote prometia.
Entre tardes cinzentas e barulhos da rua, os dois se conheciam. Ajudados pela imaginação, conseguiam álibis perfeitos para o delito. Sim, álibis, mas álibis para si mesmos, pois era difícil aceitar o que a pele lhes gritava a todo momento. E delito pois, afinal, ela tinha dezoito incompletos, e ele, como chefe da segurança pública, deveria zelar com a vida pelo cumprimento das normas constitucionais, como sempre fizera.
Inexplicavelmente, a mistura do vinho ao azul anil deu um tom de roxo magnífico, arrasador, indissolúvel. Não vê-lo era impossível. Não beijá-la era improvável. O que antes era efêmero se consumiu em um tálamo apropriado, de pouco mais que dois metros. A menina, nunca mais menina, foi perdendo a malícia e os brincos. Vendeu as saias com os brios e se mudou (ao menos isso!) para a capital, com a promoção e o carro novos do Sargento. Assim, sem que se desse conta, o mundo perdeu uma de suas mais interessantes criações para um simples homem fardado.