Retrospecto

Ontem me contaram da menina serpente. Vivia distraída e um dia se picou. Verteu ralo sangue pelos olhos. Deu gritos roucos por ar e ajuda. Embebedou-se com a luz das estrelas. E, como a dor não passasse, mordeu-se. Mordeu-se no intuito de acelerar a morte, acabar com sua vida dolorosa e ridícula. Já se conformara, aliás, já até entendera: o mundo, sem ela, continuaria o mesmo. Opa. Então, com ela, havia ainda uma chance? Sua seiva mortífera avançava pelas artérias, discutia ferozmente com seu coração. A menina mordeu-se da dor. Forte. Por longos minutos. E, assim, acabou o veneno por antídoto sem que ela percebesse. Enclausurada no silêncio da mata, foi-se recuperando. A cor voltou-lhe às bochechas e os olhos se acenderam. Pois bem os gregos já o diziam. Até hoje.

Postagens mais visitadas deste blog

Quanto do teu sal

Banderas e fuscas

Soneto Só