Questão de Perspectiva

Cada hora que passa, é mais por que te esperar. Prometo não reclamar de dois dias perdidos, das noites despertas, das manhãs cansativas e recompensantes. Nada disso faz sentido quando lembro do teu hálito fresco junto ao meu, das bobagens que insistes em dizer e das guerras de cócegas que dominam o colchão. Não encontro sobriedade na íris de teus olhos, e nem a quero: ando tomada pelos desejos insanos que acometem os incautos de tempos em tempos.
Quando levantas da cama procurando pela água que já traguei, morta de sede enquanto tu não vias, sei que vou me encontrar nos vincos de teu rosto a sorrir comigo. Teus pés vão me levar para a cozinha, na busca noturna por sustento, e a minha mão é que abrirá a geladeira para pegar a última mousse de chocolate. Ficarei a te observar, sereno, a esvaziar num átimo a taça de vidro, pedindo com as covinhas, tal criança mimada, por mais. O furinho no teu queixo assim franzido me traz lembranças dos beijos que ainda te devo. Da aposta que perdi no jogo. De como ganhei ao perder.
Volto correndo para o sofá do filme de antes, escancaro as janelas e apoio os pés na mesinha ao centro. Pego das tuas mãos aquele pedaço frio de pizza que guardastes especialmente para mim. E me divirto ao perceber que hoje sou você ontem. Mas ainda me livro desse estigma.

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