Mais alto que a maior das árvores

O sol aquentava a terra das samambaias e as poucas gotas envergonhadas nas pétalas das azaléias no pórtico, enquanto acompanhava a melodia inebriante dos pés apressados dentro de casa, loucos por tirar o máximo de proveito daqueles minutos de vida perfeita que se esvaíam. Um café da tarde como tantos outros, cujos paladares entorpeciam os dissabores de ambos. Sinatra invadia a sala, os raios de luz iam ficando oblíquos. Um olhar puxava o outro, em movimentos singelos e compassados, inflamados pelo calor da inesquecível voz azul. Eram dois corpos que voavam com o momento. A cada rodopio, as articulações se fragilizavam, os dedos perdiam a força. Fios de cabelo se apegavam à madeira do assoalho enquanto a tez perdia o viço. Envelheciam como tudo mais. O tempo dava conta de apagar cada sinal de vida, deixando em troca sardas e manchas por toda a pele. Um inimigo sem piedade, incorruptível, insubornável. Mas estava tudo bem. Ali, o tempo era deles. Vigiava-os do canto, mas os deixava serem. E eram, sem medo, sem pressa de amar.

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