Farmakon

Preciso urgente de uma pílula. A tal. Injetora de ânimo e coragem - vigor. Mas ela não existe, não aqui perto de casa. Os homens a proíbem. Espera. Talvez não seja essa pílula. Eu quero aquela outra. A de fórmula indecifrada. Será que há uma conspiração a esconder-lhe a receita? Decidi. Vou a Pasárgada. Pedirei ao rei, ele me há de prover com um estoque decente. Ei! Por favor! Preciso do telefone de um táxi! Como é? Não sabe o caminho? Mas que droga, odeio esses novatos. Vá, vá. Você não me serve. Vou a pé. Cadê meu guia de bolso? Ah, esqueci, aqui não sou turista. Pô! Por que só os turistas é que carregam as coordenadas do mundo? Que injustiça. Quando voltar de lá, anoto no meu bloquinho: quero ser turista na próxima encarnação.  Vou pedir a Iemanjá. Carregar aquelas Canon ultramodernas, lambuzada de filtro solar. Igualzinho o poema. Aliás, o poema não era sobre turistas, por que falava de filtros então? Isso me lembra a história do andróide que queria ser menino e foi procurar a fada azul. Uma versão ligeiramente diferente da contada nas igrejas. Mas, na Igreja, escreve-se Fada Azul: assim mesmo, iniciais maiúsculas, que é pra dar ares de notoriedade. Ou de presunção. Vai saber. Será que lá eu encontro a pílula? Ops, a Pílula? Ah, essa eu já provei, tem gosto de farinha e não me fez feliz. Certa feita, guardei uma no bolso para análise. E nem brilhar no escuro ela brilha! Não foi dessa vez. Preciso da pílula. Meu corpo parece, às vezes, tão grande! Preciso. Sinto que vai chegar o dia em que não caberei em mim. Cadê ela? Hoje, sobram-me braços e pernas. Dedos, os tenho aos montes. Preciso dar utilidade a tudo isso. Cansei de ficar sem ar. Quero a pílula. Uma só talvez não baste.

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